sábado, 25 de fevereiro de 2012

we found each other

Os cabelos curtos, que no seu mundo eram enormes e pretos. Vivia apenas em seu mundo, era um mundo lindo.
Deitada em um colchão no chão, afastada das outras crianças, separada por uma porta de madeira, aberta na parte de cima, mais ou menos na altura da minha cintura e me espantava que ela não conseguisse passar pela porta.
Me apoiei e fiquei apenas observando a menina, tão bonita. Uma vez ou outra a pegava olhando de canto de olho para mim, aí sorria para ela, que levava o olhar de volta para o chão. Continuei ali parada, olhando como podia, tão bela ser tão triste, mas aí percebi que não era tristeza aquele olhar perdido, pois não estava vazio. Na verdade era tão cheio de vida, dentro dos olhos dela eu podia ver um outro mundo, um mundo que apenas ela conhecia, o olhar perdido se devia só ao fato de não conhecer o nosso mundo.
Mas aí começou a se mexer, e com dificuldade se levantou. Os braços presos na cintura, amarrados, imóveis. Veio andando até mim, para a minha surpresa. Encostou na porta, e ai olhei dentro dos olhos dela, que dessa vez não desviou o olhar. Olhou no fundo dos meus também. Não sorri, não falei, não toquei. Permaneci imóvel, esperando, observando.
Ela encostou a cabeça no meu peito, aí passei a mão direita na cabeça dela, enquanto o braço direito fazia o contorno perfeito do abraço. Ela fazia força com os braços, tentando mexê-los, mas sem êxito. Eu, naquele momento, não via motivos para os braços presos, ela não machucaria a ninguém, e muito menos a si própria. Ela havia finalmente saído do mundo dela e entrado no nosso, pela primeira vez. Sentiu o amor, descobriu o sorriso.
Depois afastou a cabeça do meu peito, tirei a minha mão. Ela se desencostou da porta de madeira pintada de verde claro, me olhou, depois desviou o olhar, andou até o colchão, com dificuldade se abaixou, sentou. Voltou pro seu mundo, onde podia ser a mais bonita, a linda princesa, sem saber que poderia ser tudo isso no mundo concreto também, pois é de um brilho nos olhos encantador que eu não conhecia, porque ela nunca havia me deixado conhecer. Linda, a autista, em qualquer mundo do mundo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário