Começou por influência, talvez até curiosidade, eu sei, você sabe, ele também sabia.
Experimenta, enlouquece, se prende.
É como um buraco, um buraco fundo, escuro e quase sem volta, já está dentro, e só afunda mais. Onde estão todos aqueles que quiseram que ele entrasse nisso? Onde estão eles para ajudar agora? Pois é.
Começa a fazer qualquer coisa para ter, faz qualquer coisa, porque aquilo se tornou um vício, ele se tornanou escravo. Escravidão, lembrem dessa palavra, é a mais ideal, é a unica que mostra a dimensão disso.
Não foi por falta de tentar fazer a coisa certa. Se olhava no espelho, prometia mudar, e sabia que mudaria. Aquelas promessas eram concretas, ele realmente era uma pessoa diferente, até sair de casa, encontrar as mesmas pessoas que o ajudaram a afundar e ai tudo volta. Parecia outra pessoa, com certeza, nao era o mesmo que prometeu com tanta certeza no espelho, mas ainda assim, era mais forte, era um desejo incontrolável e ai todas aquelas promessas eram jogadas no lixo, como se nunca tivessem existido.
Quando a tentativa de fazer a coisa certa fracassou, resolveu procurar um emprego, pois precisava do dinheiro, precisava do dinheiro porque precisava comprar o que o mantinha firme, ainda que caindo aos pedaços, o combustivel que o movia, ainda que fosse o matando a cada dia.
Aparecia tres dias, sumia por tres, nem por fazer a coisa certa, nem pelo dinheiro, nada conseguia o trazer de volta para o caminho.
Dizem que a familia estará sempre com a gente, mas até os familiares cansam um dia, e agora nem lugar para morar ele tinha, não tinha nada, não tinha ninguém.
Uma frase, não dele, mas que se aplica "chega uma hora que a vida sem drogas não é mais possivel, e a vida com elas também não" e foi ai que cometeu o maior erro que um ser humano pode cometer. Na tentativa de acabar com tudo aquilo que o fazia sofrer, tudo aquilo que machucava, ele acabou com a própria vida, mas não pense que assim se livrou de tudo. A vida acabou, mas tudo aquilo que ele construiu durante a vida toda continuava ali. Via seu corpo morto, sua vida acabada, e tudo aquilo, pela primeira vez, explicito na sua frente.
Mesmo sem ninguém o ver, mesmo sem ninguém o ouvir, ele gritava. Um grito ensurdecedor e mudo de desespero.
Tentar acabar com tudo aquilo foi o pior erro, foi o maior sofrimento. Todos os dias de sua não vida dormia no canto de uma rua, em outro plano, no céu, mas "vivendo" o inferno. Acordava com mordidas, corria dos cachorros, subia até o alto de um prédio e infinitos outros espiritos, assim como ele sujos. Uns tentanto jogá-lo para baixo, outros perdidos na confusão de si. Longe estava o dono de tudo aquilo, longe estava quem "alimentava" todos aqueles, e os poupava da tentaçao sem poder ter, era conveniente, tinha ali tantos que fariam qualquer coisa pra esquecer de tudo, tantos que fariam qualquer coisa para ter o que ele tinha em mãos. Não viviam a vida que vivemos, mas ainda podiam ter as sensaçoes que temos, mesmo depois de mortos. Depois daquilo voltava para a calçada, e de novo "se matava". "Vivia" o inferno de ter de novo que se suicidar. Todos os dias a mesma dor, todos os dias o mesmo caminho, sempre igual, sempre igual, sempre igual, sempre igual.
Uma luz, em um dia igual, uma luz as vezes, tão longe, mas que trazia esperança, que o alegrava. Seus dias continuavam sempre iguais, exceto pela luz, que aparecia as vezes. Sempre igual, sempre igual, sempre igual. No meio dessa confusão de si, no meio dessa mesma dor, ele esperava essa luz, ele pedia a Deus, um Deus que ele nem sabia se existia, para que o ajudasse.
Sempre igual, sempre igual, sempre igual. A luz apareceu, perto, bem perto e sem pensar duas vezes se jogou lá dentro. Viu tudo o que tinha acontecido, viu tudo o que tinha feito, e aquilo doia, era dificil, mas a monotonia da dor nao existia mais, a monotonia do caminho sumiu.
Agora se prepara para voltar para esse mundo material, em outro corpo, com outra história, onde com certeza vai se deparar com as mesmas tentaçoes, onde com certeza vai se deparar com o suicidio e será dificil, será quase impossivel, mas ele vai tentar e de novo, de novo, outra vez. Pode ter certeza, um dia ele vai dizer não, um dia ele não vai cair na tentação.
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